terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Anorexia e anoréticos: os parasitas psíquicos!

"FOME — Divindade alegórica filha da Noite. Vergílio a coloca nas portas do Inferno; outros, à margem do Cocito; Ovídio, numa montanha gelada, o Cáucaso. Ovídio assim a pinta: “...Ela vê a Fome, a quem procurava, num campo pedregoso, arrancando com suas unhas e seus dentes raras ervas. Tinha os cabelos hirsutos, os olhos cavos, o rosto pálido, os lábios descorados e murchos, a voz rouca e rascante, pele dura, através da qual se podiam ver as entranhas. Seus ossos descarnados faziam saliências sôbre os rins arqueados; como ventre não tinha senão o lugar do ventre; podia-se crer que o seu peito flácido só tinha a ossatura da espinha dorsal. A magreza havia exagerado suas articulações; o redondo dos joelhos era inchaço e os calcanhares sobressaíam em desmesurada protuberância...” Nada melhor ilustra a fôrça diabólica dessa cruel divindade que a história de Erisícton, rei da Tessália. Homem ímpio e poderoso, não temia nem reverenciava os deuses. Um dia víolou um bosque consagrado a Ceres. Derrubou as árvores com as fitas, com as oferendas, com os festões e as tabuinhas comemorativas. Derrubou um carvalho imenso, sécular, que sozinho valia por uma floresta, sagrado; como seu criado não o quisesse ferir com o machado, Erisícton, primeiro, blasfema dizendo que, mesmo que o carvalho fôsse não só a árvore favorita da deusa, mas a própria deusa, tocaria a terra com a sua copa, e, depois, derruba-o com o ferro. O sangue esguicha do tronco ferido, as fôlhas perdem a côr, os galhos desfalecem. Um dos assistentes quer deter o machado sacrílego; Erisícton, com um golpe, corta-lhe a cabeça. As Dríades, vestidas de luto, correm a Ceres pedindo justiça. A deusa, então, resolve recorrer à Fome. Mas, como os Destinos não permitem o encontro de Ceres com a Fome, é necessário que uma Oréade vá a sua procura. A Fome, ainda que contrária à obra de Geres, conforma-se com as instruções da deusa. Dirige-se ao palácio de Erisícton, entra na sua alcova, onde ele placidamente dormia, aperta-o nos braços, entra-lhe pelo corpo, envolve-o todo, enche o vazio das veias com uma fome devoradora, uma bulimia feroz Erisícton desperta faminto. Come, come com apetite devorador, exige mais alimento, mais bebida, e sua fome sempre a crescer. O que daria para saciar uma cidade inteira, deixa-o faminto. Sua fome, o gôlfo sem fundo do seu ventre, já havia consumido parte dos bens que herdara do pai. Não faz outra coisa senão comer e uivar de fome. Por fim, seus bens todos foram vendidos para aplacar a fome insaciável. Resta-lhe a filha, digna de outro pai. Vende-a. E a fome sempre a crescer, cada vez mais imperiosa e terrível. Erisícton, então, começa a comer seus próprios membros. Devora-se a si mesmo. — V. METRA• "

Dicionário de mitologia greco-latina. Tassilo Orpheu Spalding Ed Itatiaia Ltda. 1965

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